Papo com Especialista - Capítulo 2 - Manifestações nefrológicas
"A doença de Fabry é classificada como uma doença rara. São poucas as pessoas acometidas pela doença, que está no grupo relacionado à deficiência enzimática, fazendo com que um tipo específico de enzima seja deficiente, totalmente ou parcialmente. Isso determinará os tipos de sintomas que o paciente apresentará.
Fabry pode acometer a parte renal, cardíaca, neurológica e alguns sintomas generalizados, basicamente, por conta dessa deficiência enzimática, que faz com que algumas moléculas, principalmente, lipídios, sejam acumuladas a nível sistêmico, determinando os sinais e sintomas da doença.
O paciente pode apresentar, desde criança, dores generalizadas e, principalmente, nas articulações. Muitas vezes, as dores são incapacitantes. Também é possível que os pacientes apresentem dores abdominais e lesões na pele.
No decorrer da evolução da doença, esses sintomas, geralmente, são progressivos. Em uma idade mais tardia, esses pacientes apresentam doença renal, que pode se manifestar por meio de proteína na urina e/ou perda da função renal, com aumento da creatinina, levando à necessidade de fazer hemodiálise.
O paciente pode apresentar alterações cardíacas, como arritmia, hipertrofia do ventrículo, que, na verdade, é um espessamento da parede do ventrículo, capaz de levar à evolução de infarto do miocárdio e arritmias graves. A doença também pode acometer a parte neurológica. Os pacientes podem ter casos de derrame (AVC) em idade precoce.
Os sintomas, normalmente, englobam todos esses exemplos que dei, mas, claramente, cada paciente, cada família, na verdade, pode se apresentar de uma forma diferente, a depender do tipo de variante do gene acometido da família.
De que forma a doença de Fabry é contraída? Na verdade, não é uma doença contagiosa, mas, sim, genética. Tecnicamente, é uma doença relacionada ao cromossomo X.
Caso a mãe tenha o cromossomo X, ela pode passar tanto para filhos como filhas. Caso o pai tenha a doença, pode passar apenas para as suas filhas. Em relação à gravidade, os homens costumam apresentar uma doença mais grave, com os sintomas que comentei sobre a parte neurológica, renal e cardíaca, mas, claro que as mulheres podem ter esses mesmos sintomas, de forma tão grave quanto os homens.
Geralmente, os pacientes são encaminhados ou procuram os médicos baseados nos sintomas da doença de Fabry. As crianças, que podem iniciar os sintomas em uma idade bastante precoce, podem ter dores abdominais, dores nas articulações, déficit de crescimento, dificuldade de brincar com outras crianças de forma normal, além de apresentar cansaço com facilidade.
As crianças não aguentam a mudança de temperatura e não suportam fazer atividades ao ar livre. São sintomas que, inicialmente, podem chamar a atenção do médico.
Como Fabry é rara, nem todos os médicos vão pensar na doença de cara, mas sabemos que, apesar de rara, ela existe em nossa realidade. Outras maneiras dos pacientes também procurarem os médicos derivam dos sintomas mais tardios, na faixa dos 30 a 40 anos, que podem levar a alterações renais, como proteinúria e alteração da função renal.
Os pacientes podem chegar em hemodiálise, sem ter o diagnóstico da doença de Fabry. Também é possível chegar ao cardiologista por conta de alterações como arritmia, insuficiência cardíaca e hipertrofia do ventrículo (aumento da massa do ventrículo do coração da pessoa). Os pacientes também podem procurar um neurologista, por conta dos sintomas de dor, ou até por um derrame, AVC.
A partir do momento que pensamos na doença, o médico tentará a confirmação do diagnóstico. De que forma isso é feito? Como é uma doença de deficiência enzimática, buscamos a confirmação de que essa enzima está deficiente, mas, para confirmar de fato, é feito um exame de sangue, teoricamente, simples, que busca o acometimento do gene especial que causa a doença de Fabry.
Após o momento de confirmação da doença, é muito importante a questão do heredograma, que é a árvore genealógica da família, buscando todas as outras pessoas da família que também possam ter a doença, dando a possibilidade de acesso a um diagnóstico mais precoce.
Quanto mais cedo o diagnóstico for feito, maior a possibilidade de um tratamento rápido, acesso a aconselhamento genético e a tomada de conhecimento da doença como um todo, para que o tratamento e benefícios, a longo prazo, possam ser maiores.
Quanto ao tratamento da doença: muitos pacientes questionam se existe. Há uma terapia específica para Fabry. Vale lembrar que nem todos os pacientes com Fabry recebem indicação de tratamento logo de início. Mais importante que o tratamento, é o acompanhamento que o paciente vai ter, em tratamento ou não.
O importante é, justamente, o acompanhamento com um nefrologista, para tentar diminuir a velocidade da doença renal que essa paciente venha a ter. O acompanhamento também precisa ser feito com o cardiologista. Medicações usadas para a hipertensão, arritmia e acometimento cardíaco podem ser interessantes para casos específicos. Há, ainda, o acompanhamento neurológico, derivado das alterações neurológicas que o paciente venha a ter. Outra possibilidade é o acompanhamento com pediatra e geneticistas, por conta do aconselhamento genético.
O paciente pode passar por uma mudança de vida, adotando hábitos mais saudáveis para diminuir o acometimento das dores que a doença de Fabry pode causar.
Outra coisa importante, para relembrarmos sempre, é o aconselhamento genético, que possibilita aos pacientes e pais entenderem melhor a doença, entenderem de que forma é melhor lidar com o quadro, incluindo desde o momento da infância até o crescimento da pessoa.
Se o pai ou a mãe tiverem, confirmadamente, Fabry, é possível entender de que forma a doença pode ser herdada pelos filhos, a questão da concepção, dos pais quererem ou não ter filhos. Muitas pessoas têm preocupação quanto a isso.
Os pacientes precisam saber que a evolução da doença dependerá muito dessas características, de um acompanhamento precoce e multiprofissional, do próprio paciente ter a consciência de que ele também é responsável pela sua evolução.
O tratamento, tanto multiprofissional como o específico, tende a dar uma qualidade de vida muito boa. Os pacientes conseguem retomar ou continuar com as suas atividades profissionais, escolares e esportivas.
O paciente tem uma qualidade de vida grande, mas, lembro que o acompanhamento multiprofissional, com médico especializado, junto a centros de referência da doença, são importantes para tentar indicar, no momento certo, o tratamento ou não, e fazer mudanças no dia a dia para que a evolução do paciente seja a mais favorável possível."